Em uma reunião com ministros ocorrida no último dia 9 de janeiro, Luiz Inácio determinou a presença permanente de militares do Exército reacionário e agentes da Polícia Federal (PF) na Terra Indígena (TI) Yanomami, localizada nos estados de Roraima e Amazonas. Os territórios enfrentam uma gravíssima situação de crise de fome e de saúde em decorrência do crescimento da crise e da atuação desenfreada do grande garimpo.
A TI Yanomami está desde o início de 2023 sob “Estado de Emergência” decretado por Luiz Inácio em seu primeiro mês de governo. Na ocasião, foram enviados militares do Exército reacionário e agentes da Força Nacional e Polícia Federal para “combater o garimpo”. Passado um ano dessa “operação”, a situação permanece a mesma: o ano foi lamentavelmente marcado pela ocorrência de 308 mortes de indígenas, das quais 53% eram crianças. O território segue sob epidemia de malária, pneumonia e desnutrição, que não apresentou significativa redução do número de casos desde o início da operação.
Os comandantes do garimpo
O grande garimpo, principal causador do brutal cenário que acomete os Yanomami, segue atuando na região, mesmo com a presença dos militares reacionários. Não é a toa: os últimos anos revelaram a atuação estreita dos militares, inclusive da Alta Cúpula, com os grandes empresários e latifundiários que coordenam o garimpo na Amazônia.
Em 2019, o general da reserva, então vice-presidente do País, Hamilton Mourão, recebeu uma visita do fundador da União Nacional dos Garimpeiros (UNG), José Altino Machado, popularmente conhecido como “rei do garimpo” e notadamente conhecido por comandar invasões contra a TI Yanomami nas décadas de 1970, 1980 e 1990. Altino classificou seu encontro com Mourão como “muito proveitoso” e a reunião tinha como objetivo reduzir entraves jurídicos para “impulsionar o agronegócio e a grande mineração”.
Em outubro de 2023, o general da ativa Carlos Alberto Mansur foi preso por extorquir e receber propinas de garimpeiros ilegais em uma operação que teve como alvo outros quatro militares que integravam o esquema que envolvia a também captação e venda do ouro originado do garimpo. O ano passado também revelou a participação do tenente-coronel da ativa, Abimael Alves Pinto, em esquemas de coordenação de garimpo. O militar reacionário chegou a receber pessoalmente grandes latifundiários do garimpo no Batalhão de Infantaria de Selva (BIS) em Manaus.
No mesmo período, a Força Aérea Brasileira se recusou a compartilhar com investigações do Ministério Público Federal informações sobre as rotas e identificação de aeronaves vinculadas com o grande garimpo. Talvez tenha sido por vínculos tão estreitos como esse, tanto por parte dos militares reacionários quanto por parte dos governantes, que os financiadores e coordenadores do grande garimpo passaram o ano de 2023 intocados por qualquer investigação profunda e com resultados significativos.
E a responsabilidade dos militares reacionários sobre a crise Yanomami não reside somente no seu vínculo estreito com os garimpeiros, mas também na inoperância completa em entregar as cestas básicas aos povos indígenas. Em fevereiro, mês seguinte ao decreto do Estado de Emergência, 85% delas não estavam entregues, e em junho, 50% das cestas ainda não haviam sido enviadas e os militares reacionários declararam “falta de dinheiro para o transporte das cestas básicas”, deixando os alimentos estocados na sede da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), o que mostra com clareza que é falsa a solução dada por Luiz Inácio em decretar a presença permanente destes na TI.
A quem interessa militarizar a região?
Se os militares em um ano não foram capazes de alterar em absolutamente nada a grave situação que acomete o povo Yanomami, fica claro que não interessa aos povos indígenas a sua permanência na região. No entanto, ao velho Estado, a crescente presença militar no território amazônico parece interessar, e o histórico de militarização na região pode explicar o porquê.
Em 2019, após o fatídico episódio do “Dia do Fogo”, onda de queimadas provocadas por latifundiários sobretudo na Amazônia, o então vice-presidente Hamilton Mourão decretou a Garantia da Lei e da Ordem (GLO) na Amazônia, levando à região militares do Exército reacionário. Na ocasião, organizações camponesas, como a Liga dos Camponeses Pobres (LCP), denunciaram que os militares em GLO aumentaram ostensivamente sua presença em locais onde sequer haviam incêndios, mas sim em Áreas Revolucionárias, revistando casas e interrogando camponeses acerca das “lideranças do movimento”.
Os anos de 2020, 2021 e 2022 foram marcados pela agudização da luta pela terra na Região Amazônica, com destaque às lutas do Acampamento Manoel Ribeiro e Acampamento Tiago Campin dos Santos, em Rondônia, organizados pela LCP. Na ocasião, uma megaoperação coordenada pelo Exército reacionário que mobilizou a Força Nacional e a Polícia Militar (PM) realizou um cerco que levou ao assassinato dois camponeses.
Ao decretar a presença permanente das Forças Armadas reacionárias na TI Yanomami, Luiz Inácio não soluciona o problema. Afinal, soluções de fato para o garimpo, como a entrega de terras para os camponeses aliciados e levados aos campos de mineração pelos grandes empresários e latifundiários coordenadores da operação, não são encaminhadas pelo governo. Resta, assim, maquiar a situação, e usar como pretexto para seguir com os planos de militarização da Amazônia para repressão dos que lutam pela terra na região.