Colômbia: Oportunista Petro promove repressão a camponeses

Colômbia: Oportunista Petro promove repressão a camponeses

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Gustavo Petro atua como serviçal do agronegócio e promove repressão à centenas de camponeses e indígenas. Foto: Colprensa/Mauricio Alvarado

No final de agosto e início de setembro, o governo oportunista e reacionário de Gustavo Petro promoveu uma ofensiva de repressão e despejos contra camponeses pobres e indígenas que ocupam terras do latifúndio nas regiões de Curumarri, Cauca, Dagua e Caguán. Centenas de famílias resistiram à repressão e continuam em suas terras, enquanto outras foram despejadas e prometeram retomar os acampamentos nos próximos meses. O novo serviçal das classes dominantes colombianas, que assumiu o governo em junho deste ano, enviou tropas da polícia, Exército e Esquadrão Móvel Antidistúrbios (Esmad) para despejar as massas em luta.

Velho Estado e latifundiários atuam conjuntamente na repressão de camponeses

Cerca de 200 camponeses pobres tomaram parte de um latifúndio na região de Curumarri, departamento de Cesar, no dia 21/08. Os camponeses afirmam fazer parte de um “comitê para reivindicação de terras” e que precisam de terra para trabalhar. O latifúndio pertence à Guillermo Larsen, latifundiário e empresário monopolista do ramo de cargas, comércio exterior, agência de alfândega e agência de seguros. As famílias foram despejadas durante uma ação conjunta de 80 latifundiários da região, que uniram-se em solidariedade ao latifundiário, e das forças de repressão do velho Estado colombiano.

A atuação conjunta de latifundiários e  forças policiais é algo que tem se tornado cada vez mais escancarada na Colômbia desde o governo reacionário de Álvaro Uribe. José Félix Lafaurie, latifundiário presidente da Federação Colombiana de Pecuários (Fedegan), propôs recentemente a criação de uma aliança oficial de latifundiários, para atuar como um “grupo de pecuários de atenção solidária imediata” contra ocupações de terra. Já o gerente do Fundo Pecuário de César deixou clara a subserviência de Petro aos latifundiários, afirmando que “felizmente, as autoridades estatais deixaram claro que as invasões não podem mais ser permitidas e que as forças de segurança têm 48 horas, se não houver possibilidade de diálogo, para desalojar. O que o presidente Petro disse e demonstrou até agora é que ele respeita a Constituição e a lei”.

As famílias camponesas da região de Curumarri reclamam da falta de infraestrutura na região, afirmando que os projetos realizados pela prefeitura não servem aos camponeses e também denunciam que, somente em Curumarri, existem mais de 500 hectares de terras improdutivas. Segundo o jornal democrático colombiano Nueva Democracia, a região conta com um longo histórico de luta pela terra. O mais recente acontecimento “soma-se à imensa quantidade de despejos por parte dos paramilitares em Cesar”. 

O jornal afirma que, enquanto o velho Estado despeja os camponeses, faz vista grossa à atuação do latifúndio que invade terras da União. O ex-presidente Uribe é um dos que é acusado de invadir terras públicas no município de Ubérrimo, sem contudo ser alvo de críticas das “autoridades” reacionárias do governo Petro. Além disso, na distância de somente 30 km da terra ocupada pelos camponeses, a empresa monopolista Sinergy Group tem invadido terras sem sofrer qualquer retaliação por parte dos órgãos do Estado colombiano. Camponeses reivindicam a posse destas terras. A empresa é administrada pelo grande burguês colombiano-brasileiro Germán Efromovich. Em 2020, Efromovich foi preso no Brasil por esquemas de corrupção entre a Estaleiro Ilha S/A, empresa do grupo Efromovich, com a Transpetro, subsidiária da Petrobras.

Petro despeja centenas de famílias que ocupavam terra destinada à ‘reforma agrária’

Camponeses ocupam latifúndio no Vale do Cacua. Foto: José Luis Guzmán/El País

Na região de Dagua, em Vale do Cacua, oeste do país, no dia 24/08, 350 famílias ocuparam um prédio da Sociedade de Ativos Especiais (SAE), instituição responsável por administrar bens confiscados de narcotraficantes pelo Estado. As famílias exigem que a terra seja distribuída aos camponeses. Em realidade, tais terras já deveriam ser repassadas aos camponeses sem terra, o que não ocorre pelo caráter de classe do velho Estado, pró-latifúndio e anticamponês.

Antes do velho Estado tomar posse da fazenda, o latifúndio de Dagua pertencia a Gilberto Rodríguez Orejuela, conhecido narcotraficante. A terra já havia sido ocupada em 2014, quando os camponeses foram violentamente despejados pelo Esmad, força de repressão anti-protestos que Petro prometeu extinguir durante sua campanha presidencial. O monopólio de comunicação buscou criminalizar a luta dos camponeses, afirmando que seria um prejuízo aos animais cuidados pela fundação Paz Animal, versão que foi desmentida inclusive por ambientalistas. Terry Hurtado, da organização Cali Verde, afirmou ao monopólio de imprensa El Tiempo: “O que descobrimos depois da visita [à ocupação] é que os animais não foram afetados, foram respeitados, conversando com as pessoas que estão realizando a ocupação, afirmam que não têm nenhum interesse, nenhuma intenção de afetar os animais, e se comprometem… que os animais não serão tocados, eles serão cuidados”.

Mesmo assim, o velho Estado colombiano, aliado à propaganda reacionária do monopólio de imprensa, promoveu o despejo da ocupação. Os camponeses, em alto espírito, afirmaram que pretendem voltar a ocupar a terra em poucos meses.

“Nós não podemos ficar de braços cruzados esperando que alguém venha tocar à nossa porta e dizer que vai entregar uma escritura dessa propriedade para que você trabalhe… isso nunca vai acontecer, nunca vão nos ter em conta. A decisão é das 350 famílias que estão buscando um lugar para cultivar, para semear”, relatou um dos camponeses ao monopólio de imprensa El Tiempo.

17 anos de heroica resistência indígena

Na região de Cauca, no oeste do país, em torno de 1 mil famílias indígenas empreenderam uma heroica resistência contra as tropas do Exército colombiano e do Esmad. Os indígenas, que ocupam a terra há 17 anos, haviam recebido, no dia 31/08, uma ordem de despejo do Ministro da Defesa da Colômbia, Iván Velásquez. A ordem do ministro reacionário exigia o abandono da terra em 48 horas. Após 6 horas, tropas do Esmad estavam em prontidão na região. 

Passadas as 48 horas, os soldados do Esmad e do Exército colombiano iniciaram a repressão dos indígenas com o uso de bombas de gás e armas de fogo. Os indígenas resistiram aos ataques da reação e não abandonaram suas terras. Eles denunciam que estão sofrendo intimidação na região, com constantes patrulhas feitas pelo Exército e moradores sendo constantemente fotografados e filmados pela reação. 

O departamento de Cauca possui um longo histórico de repressão e luta pela terra. Em 1991, 21 indígenas foram assassinados por pistoleiros e tropas da Polícia Nacional Colombiana, na chacina que ficou conhecida como Massacre do Nilo. O norte do departamento de Cauca possui terras muito férteis que hoje estão na posse de latifúndios produtores de cana, enriquecendo somente poucas famílias de grandes proprietários, muitas das quais têm raízes espanholas e/ou receberam milhares de terras pelo Estado colombiano desde a independência até a atualidade. Tais famílias concentram o poder político regional e nacional.

O histórico de resistência dos indígenas dessa localidade permite-lhes concluir, pela própria experiência regada com sangue do assassinato de 21 indígenas somente em 1991 e da luta contra mais de 400 despejos, que somente pela luta decidida, sem ilusões com as promessas do regime burocrático-latifundiário, é o que garante a conquista da terra.

Ocupação por moradia expulsa tropas do Esmad

Camponeses expulsam tropas da Esmad enviadas por Petro. Foto: Opanotícias

No município camponês de El Caguán, em Huíla, em torno de 500 pessoas ocuparam um prédio que estava abandonado há décadas. O governo reacionário e oportunista de Gustavo Petro não tardou a enviar tropas da Esmad para despejar os moradores. O que se sucedeu foi uma verdadeira batalha em que as massas, encapuzadas e armadas de paus, pedras e fogos de artifício, saíram vitoriosas.

Atualmente na Colômbia, o déficit habitacional atinge mais de 5 milhões de famílias e cresce ano após ano. Enquanto isso, cinco construtoras (Amarillo, Marval, Colpatria, Bolívar e Cusezar) acumularam fortunas milionárias construindo casas ilegais. A inflação de mais de 10% impõe a um número crescente de famílias a cruel escolha entre “comer ou pagar aluguel”.

Ativistas democrático-revolucionários saúdam luta pela terra

Ativistas democráticos realizam manifestações em apoio à Revolução Agrária. Foto: Nueva Democracia

A luta dos camponeses e indígenas na Colômbia tem conquistado apoio nas cidades do país. Em Bogotá, Medellín e Ibagué, ativistas populares e revolucionários realizaram pichações, hasteamento de faixas e protestos em apoio à luta pela terra. 

Pichações com as consignas Abaixo o governo oportunista!, Viva a luta camponesa!, Apoio total às tomadas de terra!, Viva a Revolução Agrária, Morte ao latifúndio! e Grande acordo nacional com os ricos, repressão policial para os pobres estamparam as paredes da Universidade de Antioquia (UdeA), em Medellín. Na mesma universidade, uma faixa escrita Petro e Francia ordenam o despejo para que o latifundiário viva bem. Abaixo o governo oportunista! Terra para quem nela trabalha! foi estendida em uma área do campus. A mesma consigna foi repetida em uma faixa estendida na Universidade de Tolima, em Ibagué. 

Pichação realizada em Universidade por ativistas democrático-revolucionários. Foto Nueva Democracia

Pichação em universidade exalta Revolução Agrária. Foto: Nueva Democracia

Francia Márquez é a vice-presidente do país que, junto com Gustavo Petro, tem dirigido a repressão brutal à luta pela terra. As ações de propaganda ocorreram ao longo da semana passada. 

No dia 09/09, um protesto foi organizado nos arredores da UdeA. Em torno de 60 pessoas, dentre eles ativistas do Movimento Estudantil à Serviço do Povo (Mesp) e da Liga da Juventude Revolucionária (LJR) estiveram presentes. Importantes vias da região foram fechadas pelo protesto, enquanto consignas como Terra a quem nela trabalha e Morte ao latifúndio foram exclamadas e cartazes em apoio à luta pela terra foram erguidos. Uma faixa com o nome de diversos latifundiários foi incendiada.

Ativistas incendeiam faixa com nome de latifundiários. Foto: Captura de Tela/Nueva Democracia

Ativistas da Organização Estudantil do Politécnico Jaima Isava Cadavid, no sul da cidade, estenderam uma faixa com a consigna Petro e Francia ordenam o despejo para o latifundiário viver bem. Viva a liberação da Madre Tierra! A liberação de Madre Tierra é como tem sido chamado o movimento dos indígenas na região de Cauca.

Estudantes da Universidade Pedagógica Nacional realizaram um vídeo denunciando os despejos promovidos por Francia e Petro e exaltando a luta pela terra.

A luta pela terra na Colômbia e a miséria do povo

Esses levantamentos de camponeses e indígenas na Colômbia possuem, segundo o jornal Nueva Democracia, um problema estrutural de fundo explicado pelas bases econômicas do país. “A questão agrária e camponesa é um dos problemas básicos da sociedade colombiana”, afirma o jornal. E explica: “As grandes propriedades, tanto improdutivas quanto ‘produtivas’ a serviço do grande capital e dos imperialistas, são um fardo que não permite o desenvolvimento de nossa nação e que mantêm milhões de massas na miséria. Um por cento das fazendas ocupa 81% das terras do país, enquanto há milhões de camponeses pobres com pouca ou nenhuma terra. Durante 200 anos de república, os governos da época intitulam as terras devolutas da Nação aos proprietários de terras e à grande burguesia, classes servidas pelo velho Estado.”.

O Observatório do Programa Presidencial de Direitos Humanos calculou em 2013 que havia pelo menos 244.606 famílias violentamente despejadas de suas terras entre 1986 e 2012.  A maior parte de suas terras está agora sendo explorada pela empresa multinacional de carvão Cerrejón e por proprietários de terras que plantam palma africana. Dos pedidos à Unidade de Restituição de Terra, apenas 86 casos foram decididos, o equivalente a 1,2% do total (2017, Relatório de Gestão da Unidade de Restituição de Terra)”.

De acordo com dados disponibilizados pelo Nueva Democracia, entre 5 e 6 milhões de terras foram desapropriadas de camponeses nas últimas décadas, principalmente pela atuação de paramilitares em conluio com o velho Estado. Enquanto isso, a lei de restituição de terras só regulamentou 4% dos casos em todo o país nos últimos 10 anos. O jornal afirma que os 3 milhões de terras que Petro promete distribuir aos camponeses mal chega a ser metade das terras que foram desapropriadas nos últimos anos. Isto é, para fingir resolver esse problema, iniciado durante a colonização do país e nunca resolvido por uma revolução democrática triunfante, os sucessivos governos colombianos promovem falsas reformas agrárias que em nada mudam essa estrutura do país e só servem para aprofundar o problema agrário e camponês. 

Em meio à profunda crise do capitalismo burocrático na Colômbia, impulsionada pela crise geral de decomposição sem precedentes do imperialismo, o governo de Petro e seus antecessores impõe ao povo colombiano miséria e desemprego, que atinge 14,3% da população. A inflação, em crescimento constante desde maio, atingiu 10,8% em agosto e também ameaça o povo pobre do país latino. Em torno de 30% da população indígena vive em pobreza extrema, enquanto 79% das crianças indígenas sofrem de desnutrição. 

Governo de grandes burgueses e latifundiários joga ilusões às massas 

Em seu editorial do dia 26/08, o jornal Nueva Democracia destrincha o caráter reacionário, anti-povo e oportunista do governo Gustavo Petro. Como consequência direta de grandes rebeliões populares, com especial destaque para o Grande Levantamento Popular em abril de 2021, o maior e mais importante, onde centenas de milhares de pessoas se mobilizaram por meses contra a fome, a injustiça e a opressão, as classes dominantes reacionárias colombianas ficaram amendrontadas e não podem seguir dominando como antes.

Neste contexto foi que ocorreram a nova edição da farsa eleitoral que deu vitória à Petro, sendo apoiado pelos mesmos partidos e grupos políticos que foram a sustentação dos governos reacionários anteriores (como de Ivan Duque e Álvaro Uribe). A tática das classes dominantes de apostar todas suas fichas em um candidato oportunista foi necessária, pois, segundo o Nueva Democracia, “frente à crise econômica e ao desprestígio a que chegaram as instituições do velho Estado como a polícia, congresso, governo, etc., e frente a massiva rebelião popular, as classes dominantes não podiam seguir utilizando a mesma tática” de usar o uribismo e sua política de violência e corte de direitos do povo abertamente.

Dentre as promessas eleitoreiras de Petro feitas ao povo (educação gratuita, saúde, fim da Esmad) e às classes dominantes e ao imperialismo (de prosseguir com acordos com o FMI, com o Tratado de Livre Comércio entre USA-Colômbia, dentre outros), o jornal democrático destaca a proposta de “reforma agrária” do governo Petro.

Logo após a eleição, Petro afirmou em entrevista que “o país nunca logrou fazer uma reforma agrária”, e prometeu: “Hoje, nós voltaremos a tentar e, vou a confessar, queria fazê-la da mão dos Estados Unidos”. O jornal é contundente na denúncia: “Uma reforma agrária que sirva à maior potência imperialista que domina a nação desde mais de 100 anos! Aos que desmembraram nosso território para roubar o canal do Panamá, aos exploradores e assassinos, aos que servem da permanência do problema da terra em nosso país, aos que vivem de explorar a nossa povo, aos impulsionadores do genocida Plano Colômbia, a esses mesmos!”.

Cecilia López, nomeada como ministra da Agricultura, deixou ainda mais claro os planos para a “reforma agrária” falida: “Vai haver reforma agrária, porém consiste em algo muito diferente ao que aterroriza a gente. A reforma agrária consiste em comprar terras que não se estão utilizando, o governo a compra e as distribui aqueles setores que podem produzir imediatamente. Aqui não se vai expropriar nenhuma terra”.

O Nueva Democracia denuncia toda a podridão da proposta, apontando que se trata de uma política anti-camponesa e pró-latifúndio: “Como?! Incrível! Agora essa simples fórmula de tributação ao latifúndio improdutivo basta para solucionar o problema mais profundo da sociedade colombiana, base das constantes lutas camponesas e da guerra que se viveu principalmente no campo durante quase todo o século XX e até nossos dias. Segundo isto, não faz falta que o campesinato tome pela força a terra que lhe pertence e acabe, assim, com o latifúndio, senão que com esta pressão econômica, voluntária e pacificamente os latifundiários entregarão a terra!”. 

O jornal destaca que é a mesma política agrária dos anos de 1930 e de 1960, de “impulsionar a penetração do grande capital no campo, promover o mercado de terras, os créditos e uma marginal e lenta entrega de terra ao campesinato para conter sua luta”. 

“Tanto agora como durante o último século, ficou mais que claro para o campesinato que os latifundiários não soltarão a terra por nada, que os camponeses terão que levar a cabo sua própria revolução agrária, tomando pela força todas as terras do latifúndio sob o lema de Terra a quem a trabalha! Não é possível resolver o problema da estrutura agrária respeitando a propriedade privada dos latifundiários, nem respeitando a ‘institucionalidade’, justamente porque esta estrutura agrária foi construída violando e explorando os camponeses, negros e indígenas e é mantida por uma institucionalidade a serviço dos grandes latifundiários e da burguesia”, conclui o Nueva Democracia.

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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