Epidemia de dengue no Brasil: tubo de ensaio para a guerra entomológica? 

O ano de 2024 vem registrando os piores números em casos de infecção por dengue na história do país. Durante os primeiros dois meses do ano, foi registrado um aumento de 315% em infecções em relação a 2023. Em números absolutos, isso representa um aumento de 165.839 casos para 688.461, quase a metade dos casos totais do ano passado

Epidemia de dengue no Brasil: tubo de ensaio para a guerra entomológica? 

O ano de 2024 vem registrando os piores números em casos de infecção por dengue na história do país. Durante os primeiros dois meses do ano, foi registrado um aumento de 315% em infecções em relação a 2023. Em números absolutos, isso representa um aumento de 165.839 casos para 688.461, quase a metade dos casos totais do ano passado
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O ano de 2024 vem registrando os piores números em casos de infecção por dengue na história do país. Durante os primeiros dois meses do ano, foi registrado um aumento de 315% em infecções em relação a 2023. Em números absolutos, isso representa um aumento de 165.839 casos para 688.461, quase a metade dos casos totais do ano passado. Entre esses, mais de 5 mil são graves, um crescimento na ordem de 196% de casos graves em relação ao mesmo período no ano passado. Entre mortes confirmadas e suspeitas, também já chegamos a quase metade do número registrado em 2022, que até então havia sido o pior da história. 

A projeção do Ministério da Saúde para esse ano é que 4,2 milhões de brasileiros sejam infectados até dezembro. Sete estados e capitais decretaram estado de emergência em saúde. O aumento das infecções em alguns locais, como Santa Catarina, que teve uma taxa 650% maior que no ano passado, supera a média.

Esse crescimento absurdo de casos de dengue no país vem sendo registrado na década ao menos desde 2022. Naquele ano, houve crescimento de 162,5% em relação a 2021. O número de mortos, 1.116, também superou o maior até então na história, de 986 pessoas mortas em 2015, e foi quase cinco vezes maior que o do ano anterior. 

Na época, os monopólios de imprensa afirmaram que isto se explicava pela diminuição de visitas de agentes de saúde durante a pandemia. O padrão de crescimento, porém, continuou em 2023, com alta de 15,8% em infecções. Já se falava, então, em “mudança de sorotipo” dos vetores. As mortes também chegaram perto do número registrado no ano anterior. 

O que poderia parecer um simples acontecimento de ordem natural, dadas as condições climáticas do país, tem implicações claras já mesmo para a situação sanitária, a qual é negligenciada pelo velho Estado de uma forma geral, especialmente em bairros pobres. Contudo, uma perspectiva ainda mais sombria pode explicar os números exorbitantes registrados e previstos para o ano de 2024 em casos de infecção por dengue. 

Epidemia ou projeto?

As pesquisas sobre o uso de edição genética no combate ao vetor Aedes Aegypti foram iniciadas em 2011 no Brasil pelo monopólio farmacêutico de capital ianque Oxitec. Apenas em 2015, porém, os primeiros “mosquitos Aedes do bem”, como são comercialmente chamados, foram lançados em Itaberaba e Juazeiro, Bahia. Neste ano, tivemos um dos maiores surtos de dengue no país em toda sua história, que viria a ser desbancado apenas pelo surto de 2022. A data coincide também com as epidemias de Zika e Chikungunya.  Na Bahia, especificamente, os casos de dengue aumentaram, na época, em 151,7% em relação a 2014. O estado também esteve entre os cinco com maior quantidade de casos de Chikungunya.

Sem que relações entre o crescimento de infecções e as ações do monopólio fossem investigadas de forma independente, novos mosquitos foram lançados em Indaiatuba, São Paulo, em 2019, aos bilhões, e a Oxitec passou a atuar posteriormente em diversas cidades no estado de Minas Gerais, Amazonas, São Paulo e Rio Grande do Sul, com ainda outros lançamentos de mosquitos sendo feitos em 2021 e 2022.

Em 2019, a Fundação Gates, doou para o Programa Mundial de Mosquitos da Organização das Nações Unidas (ONU) 50 milhões de dólares, a serem pagos no espaço de três anos, para o desenvolvimento de pesquisas sobre a implantação da bactéria Wolbachia em mosquitos transmissores de doença, incluindo o mosquito da dengue. Logo em 2021, a Fundação Gates doou mais 55 milhões de dólares para o International Vaccine Institute (IVI) para o desenvolvimento de vacinas contra a dengue. 

Foi também em 2021 que o monopólio farmacêutico japonês Takeda, empresa que hoje produz as vacinas QDenga adquiridas pelo governo federal, anunciou que o Brasil seria a maior parte do seu “Plano Aspiracional” para a expansão de operações até 2025 (a farmacêutica já constava entre as dez maiores do país). A Fundação Gates havia estabelecido uma relação com a empresa em 2016, através da doação de 38 milhões de dólares para a produção de vacinas para poliomielite. Em 2022, a Takeda firmou parceria com a UNICEF para apoiar a estratégia de Água, Saneamento e Higiene (Ashi) no Brasil, nova ação supostamente relacionada ao combate à dengue.

Em 2023, o Programa Mundial de Mosquitos da ONU, apoiado pelo dinheiro da Fundação Gates, iniciou seu plano de lançar bilhões de mosquitos modificados com a bactéria Wolbachia no Brasil como medida para controlar a reprodução do Aedes aegypti. Neste mesmo ano, a Oxitec também tornou-se receptora de doações da Fundação Gates, com 4.8 milhões sendo doados para pesquisas sobre edição genética de carrapatos.

Em 2024, logo nas primeiras semanas, o país já havia registrado quatro vezes mais casos de dengue que no mesmo período no ano anterior, tendo um aumento de 315% em infecções nos dois primeiros meses e chegando a um estágio alarmante de aumento de incidência epidêmica que, de fato, já vinha acontecendo ao menos desde 2022.

Ainda no 21 de janeiro, chegaram as primeiras 750 mil das 5,9 milhões de doses da vacina Qdenga compradas ainda em 2023 e produzidas pelo monopólio farmacêutico japonês Takeda. A compra teve o valor declarado de R$ 4.623.685,20.

Na última semana de fevereiro, a Takeda firmou um acordo com o laboratório indiano Biological para produzir 50 milhões de vacinas por ano, chegando à 100 milhões em 2030, enquanto o Brasil já se compromissou com a compra de 6,5 milhões de vacinas esse ano e 9 milhões para o ano que vem.

As coincidências e relações, assim, são muitas. As datas de aumento de casos de infecção de dengue coincidem, como podemos ver, desde 2015, com a liberação de mosquitos editados geneticamente pelo monopólio ianque Oxitec e pelo Programa Mundial de Mosquitos da ONU. A primeira liberação de mosquitos alterados geneticamente pela Oxitec também coincide com a epidemia de Zika vírus de 2015-2016 e de Chikungunya. Em 2023, o Programa Mundial de Mosquitos da ONU liberou seus próprios mosquitos editados geneticamente e, em 2024, temos uma nova epidemia recorde. A Takeda definiu que seu plano de expansão no mercado farmacêutico brasileiro deveria completar-se até 2025, ano em que o governo já se comprometeu previamente a um novo acordo de compra de vacinas da empresa. A ponta ainda mais ou menos solta, que iremos atar posteriormente, é Bill Gates.

Isso tudo ao menos indica a necessidade de uma análise séria sobre a relação entre as recentes crises epidêmicas de dengue e a libertação de populações (na ordem dos bilhões) de mosquitos editados geneticamente por monopólios e pela ONU.

Os alertas das pesquisas e um silêncio forçado

Apesar da conveniente desatenção do Estado brasileiro quanto a isso, o uso de mosquitos editados geneticamente para controle do vetor da dengue já foi contestado, bem como a própria prática da edição genética é feita, no geral, sem que tenham sido abordados seus potenciais riscos.

Uma pesquisa divulgada pela GMWatch revelou ainda em 2021 que os “mosquitos estéreis” ou “mosquitos Aedes do bem” da Oxitec voltam a ser férteis, resultando em populações de mosquitos modificados geneticamente persistindo no ambiente. A primeira geração de mosquitos da Oxitec foi feita para não sobreviver sem acesso a um antibiótico específico, a tetraciclina. A segunda geração seguiu o mesmo princípio, mas aplicado apenas às fêmeas, o que, de fato, aumenta a persistência de machos férteis. De forma geral, os processos não são a prova de falhas e podem frequentemente resultar em hibridização dos mosquitos modificados com a população comum. Pesquisadores temem que isso possa alterar o padrão epidemiológico e causar o surgimento de ainda mais cepas da doença. O estudo realizado pelos cientistas Yang Zhao, Marc F. Schetelig e Alfred M. Handler revela ainda que a esterilidade nos mosquitos pode ser revertida, o que significa que populações mais resistentes ficarão no ambiente. Mutações genéticas não-pretendidas, possibilidade completamente ignorada pelos monopólios farmacêuticos, podem causar o mesmo efeito. 

Um outro estudo, da revista Nature, dizia ainda que os mosquitos frutos da hibridização seriam mais resistentes à inseticidas, os conhecidos “supermosquitos”, mas posteriormente a revista retratou-se apesar da comunidade científica não apresentar unanimidade na decisão, o que pode apontar para uma influência externa – bastante comum.  

De fato, as pesquisas que apontam para os riscos da edição genética de mosquitos e para os riscos da edição genética de forma geral são extensamente desincentivadas. É aqui que o papel de Bill Gates se ressalta, em conluio com o Pentágono. 

Em 2017, Bill Gates pagou 1,6 milhões de dólares a uma agência de relações públicas para bloquear a moratória proposta à ONU sobre a questão da edição genética até que sua segurança pudesse ser estabelecida. De acordo com e-mails obtidos pelo Grupo ETC, a Emerging Ag recrutou mais de 65 especialistas, incluindo um alto funcionário da Fundação Gates, um funcionário da Agência de Projetos de Investigação Avançada de Defesa do Pentágono (DARPA) e cientistas que também recebiam financiamento da DARPA para convencer a ONU a não interromper as pesquisas em edição genética até que fossem declaradas seguras. A DARPA, no geral, tem papel proeminente em pesquisas de edição genética em diversos setores. Bill Gates, no ano seguinte, afirmaria que seria “uma tragédia não aproveitar a oportunidade” de utilizar a edição genética em países pobres. 

Adicionalmente, o  Distrito de Controle de Mosquitos de Florida Keys, USA, e a Oxitec anunciaram em 2021 que iniciariam a liberação de cerca de 750 milhões de mosquitos Aedes Aegypti editados geneticamente usando a tecnologia de edição CRSPR no local, com apoio da DARPA. O local não é epidêmico, com o Aedes representando apenas 4% da população de mosquitos e apenas 26 casos sendo reportados no último “surto” em 2020. Por outro lado, Florida Keys é um constante destino de migrantes cubanos

A DARPA vem também conduzindo pesquisas sobre a edição genética de insetos em plantações, sem determinar potenciais riscos e sob uma total falta de transparência. 

Um histórico duvidoso

Além da ligação com edição genética, a Fundação Gates, monopólios farmacêuticos em geral e organismos internacionais têm um histórico duvidoso, para dizer o mínimo, no financiamento e na conduta de pesquisas e de ações de combate à doenças epidêmicas.

A Fundação Gates também esteve envolvida no financiamento da suposta “vacina da malária”, custeando outra pesquisa da Oxitec (que desde então apagou o comunicado em que relata isso, porque, como diz o ditado, filho feio não tem pai). À época, 12 países africanos receberam, sob os auspícios da ONU, 18 milhões das vacinas Mosquirix (RTS,S/AS01) produzidas pelo monopólio farmacêutico britânico GSK em 2023. A vacina que supostamente resolveria o problema das crises de malária no continente africano requer 4 doses que duram apenas uns poucos meses. 

O dr. Jonathan Jerry, da canadense McGill University’s Office for Science and Society, porém, escreveu um longo artigo contrariando a eficácia da Mosquirix, defendida pela Organização Mundial de Saúde (OMS). O artigo inicia questionando o próprio uso de três países africanos e de crianças para a pesquisa sobre a eficácia da vacina. Quanto aos efeitos e logística da aplicação da “solução”, a vacina tem uma eficácia de 40%, necessita das quatro doses, o que não parece apontar para um cenário realista de inoculação na África subsaariana, e seus resultados variantes no combate à doença apontam para um grande risco de reinfecção, não sendo possível prever qualquer grande resultado no fim das contas. Além disso, locais onde a vacina foi testada em maior escala tiveram crescimento em casos de meningite, de malária cerebral e um aumento de duas vezes em mortes por diversos motivos em meninas nas quais foi injetada a vacina. 

A OMS, ainda, não utilizou protocolos de consentimento nos países após o fracasso para uma nova pesquisa que visava descobrir se os problemas que surgiram eram decorrentes da vacina ou não. Os novos testes foram feitos como campanhas de vacinação comuns e também embasaram a distribuição em larga escala defendida pela organização posteriormente. A comparação com o uso de cobaias humanas pelos nazistas é inevitável.

O contrato firmado entre a UNICEF e a GSK para a distribuição das vacinas de malária é de 117 milhões de dólares. A Gates Inc., por sua vez, declarou que pretende injetar 80-100 milhões de vacinas deste tipo no continente africano até 2030, o que se reverteria em um lucro de cerca de 1 bilhão de dólares ao fim das contas.

Uma observação a ser feita é que a malária chega a afetar mais de 200 milhões de pessoas anualmente. Em 2019, por exemplo, 229 milhões contraíram malária e mais de 400 mil morreram em decorrência da doença. Uma comercialização ampla de vacinas, portanto, é lucrativa e deverá garantir lucros por anos antes que seu uso possa ser cabalmente contestado, levando em conta a manipulação já presente de pesquisas em torno do tema.

Outro fato que salta aos olhos é que o CEO da Oxitec, Gray Frandsen, tem uma longa e sanguinária história com o Departamento de Estado do USA nos Balcãs, como conselheiro da Marinha ianque e membro da Organização Não-Governamental (ONG) International Crisis Group. O grupo, segundo artigo de Tom Hazeldine, apesar de ser descrito pela imprensa monopolista como grande defensor da paz, recebe doações na ordem da metade de seu orçamento anual de países membros da Otan, organização com a qual colabora frequentemente, enquanto a outra parte vem de monopólios como RBS, Chevron e BHP Billiton, e tem entre seus membros mais destacados apologistas do regime genocida de Suharto na Indonésia, como Gareth Evans, presidente da ONG, Thomas Pickering, envolvido nas guerras da América Central na era Reagan e intermediário de traficantes de armas para os Contras, o general de reserva Wesley Clark, que liderou o bombardeio de Belgrado, entre outros.

No fim, a mesma velha guerra de baixa intensidade

Em 2016, Bill Gates afirmou que a edição genética poderia potencialmente ser utilizada como arma biológica. Apesar da predição parecer apocalíptica, ela não é nada ingênua ou conspiracionista. 

Gates prefere, por seu lado, agir como se tal ideia fosse parte de um roteiro hollywoodiano, onde um suposto terrorista individual com acesso à tecnologia poderia utilizá-la contra o mundo. A realidade, porém, é muito menos artificial.

Por meios evidentes ou não, a edição genética pode ser e potencialmente já está sendo utilizada como forma de aumentar o morticínio do povo, especialmente em países oprimidos. A liberação de mosquitos editados geneticamente ocorre principalmente em bairros pobres, sob uma bandeira “humanitária”, demonstrando por um lado seu caráter eugênico, uma vez que a segurança da prática não pode ser atestada, e, por outro, que o problema seria muito mais facilmente resolvido com o investimento em uma situação sanitária melhor, questão que recebe investimentos muito menores. Esta situação se repete no caso do uso de vacinas sem eficácia comprovada e que potencialmente aumentam riscos para a saúde na África.

As instituições internacionais, submetidas aos interesses monopolistas, agem como auxiliares nesse processo, bem como os governos submissos dos países oprimidos. É óbvia, ainda, no caso da edição genética, a participação do Pentágono, bem como do capital financeiro de forma geral, que financia e garante que a prática continue sem qualquer comprovação de sua segurança.

No fim, o uso ou não da edição genética em atos terroristas ou mesmo em guerras declaradas pode ser uma questão ainda em aberto. O uso potencial e possivelmente já cimentado da tecnologia na guerra de baixa intensidade contra o povo e como parte do aumento da lucratividade dos monopólios, por outro lado, é uma questão premente e que nos lembra que, para não sermos negacionistas da ciência, devemos compreendê-la de forma global e não apenas como fruto de nichos hiper-especializados de suas respectivas áreas. 

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