Honório da Silva Lemes: O Tropeiro da Liberdade

As ânsias revolucionárias do povo não haviam sido saciadas com o golpe de 1889, liberdade, fraternidade e república ainda eram ideias que inspiraram revolucionários a lutar. Honório Lemes foi como muitos outros gaúchos pobres, lavradores e peões, que atenderam o chamado da revolta.

Honório da Silva Lemes: O Tropeiro da Liberdade

As ânsias revolucionárias do povo não haviam sido saciadas com o golpe de 1889, liberdade, fraternidade e república ainda eram ideias que inspiraram revolucionários a lutar. Honório Lemes foi como muitos outros gaúchos pobres, lavradores e peões, que atenderam o chamado da revolta.
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Honório da Silva Lemes nasceu em Cachoeira do Sul, no centro do Rio Grande do Sul, no dia 23 de setembro de 1864. O pai e a mãe eram camponeses que possuíam pouca terra, onde plantavam arroz. Aos 12 anos foi com a família para Rosário do Sul, na fronteira oeste, onde desde bem cedo começou a trabalhar como tropeiro, ofício do pai, por suas idas e vindas levando o gado para todos os cantos do Rio Grande do Sul, nunca aprendeu a ler e escrever direito. Pobre e camponês, não poderia ter escapado da guerra nem se quisesse. Passados anos da ‘república da espada’, instaurada pela farsa da proclamação da república, as tempestades revolucionárias começaram a inundar o Brasil. Em 1893, os políticos federalistas, liderados por Gaspar Silveira Martins, iniciaram uma coluna para destituir o governo no Rio de Janeiro, iniciando a Revolução Federalista. Foi nesta época que Honório Lemes largou o arado e tomou em mãos o fuzil, o qual ele nunca mais largaria, ingressou como soldado nas fileiras do exército Maragato.

As ânsias revolucionárias do povo não haviam sido saciadas com o golpe de 1889, liberdade, fraternidade e república ainda eram ideias que inspiraram revolucionários a lutar. Honório Lemes foi como muitos outros gaúchos pobres, lavradores e peões, que atenderam o chamado da revolta. Por seu grande conhecimento da sua região nativa, a Serra do Caverá, logo ficou conhecido como O Leão de Caverá.

A coluna de Silveira Martins fora derrotada no Paraná, o ano era 1895, encerrava-se a Revolução Federalista. Honório Lemes, com 31 anos e tendo atingido o posto de Coronel, retorna para campo, não ganhando riqueza alguma por seu serviço militar. Se casou, teve seis filhos, e por 30 anos permaneceu no ofício de lavrador. Em depoimento para o documentário “O Leão do Caverá”, a neta de Honório Lemes lembra do avô: “Ele era de poucas palavras, não conversava muito”, “Sempre foi um bom pai.” e “Aprendi muito com meu avô, era meio rude, assim, mas ele sabia das coisas”.

Mas a tempestade se armava, por todo o Brasil soprava o vento revolucionário, neste tempo, sua vanguarda eram os revolucionários liberais, principalmente vindos do exército, que sonhavam em uma república verdadeiramente republicana e uma democracia verdadeiramente democrática. Em 1923, os Maragatos, partidários do Partido Federalista, se sublevaram contra o tirânico governo de Borges de Medeiros, presidente do Rio Grande do Sul por mais de três décadas. Se iniciava a última das grandes guerras gaúchas, e Honório Lemes, general veterano, atendeu o chamado da revolução, e pegou em armas novamente, aos 59 anos de idade. Levantou um exército de mais de 300 homens em Rosário do Sul, gastando até seu último centavo para armá-los.

Coluna de Honório Lemos. Foto: Reprodução

Honório foi protagonista da maior derrota governamental da guerra, que vinha, em contrapartida, após a Batalha de Santa Maria Chico, a maior derrotada Maragata, onde tombaram mais de 2000 homens, incluindo o general revolucionário Adão Latorre. Perseguido pela Brigada Militar, Honório Lemes demonstrou sua genialidade militar ao driblar os brigadianos e seus mercenários uruguaios, forçando as forças inimigas a se separarem em 3 grupos, que foram, um a um, emboscados pela cavalaria de Honório Lemes, os levando para a linha de fogo dos atiradores maragatos, o exército inimigo fora aniquilado. A guerra de movimentos de Honório Lemes seria, mais de cem anos depois, estudada pelo guerrilheiro argentino Che Guevara e o vienamita Giap Ho. 

“A força toda, ou quase toda, suspendeu a ação bélica, ou entreparou, para observar o inacreditável, atônicos como o próprio inimigo ante a progressão ritmada daqueles cem homens avançando e atirando a pé e de pé, mesmo abrindo uns claros dos que iam tombando pelas balas inimigas. E não éramos somente nós, os seus companheiros, a admirá-los, surpresos: diante daquela marcha deliberada para o entrevero, notava-se o próprio inimigo os contemplando com assombro e, talvez, com admiração” Das memórias do Cel. Paulino Cypriano Heygert, que participou da batalha.

As notícias de um simples homem do campo que vencia as tropas Borgistas com suas manobras implacáveis o transformaram em verdadeiro herói do povo. O Correio do Povo de 8 de junho de 1923 noticiava: “As 14 horas de ante-hontem, chegou a esta cidade, em automóvel, o general Honório Lemos… O general Honório Lemos acompanhado de officiaes, voltou para o hotel, onde grande massa de povo, representando todas as classes, o aguardavam.”

Os líderes do Partido Federalista, encabeçado por Joaquim de Assis Brasil, porém, não compartilhavam as ânsias revolucionárias dos seus combatentes. Ao final de 1923, o Pacto de Pedras Altas encerrava a guerra entre Maragatos e Chimangos, mas acordos entre elites não apagaram o fogo da revolta, os maragatos combatentes rejeitaram o acordo e continuaram a guerra, Honório Lemes foi um deles, ainda não havia terminado sua carreira de revolucionário. Em 1924, o quartel de Santo Ângelo se sublevou, liderado por Luís Carlos Prestes e Miguel Costa, a Coluna revolucionária marchou norte para destituir o governo de Artur Bernardes, a revolução continuava bem viva. Honório Lemes, exilado no Uruguai, atravessou a fronteira para se juntar aos combates novamente, movimento que fazia parte dos esforços coordenados de exilados Maragatos que eram contrários ao acordo de Pedras Altas.

Armados apenas de revólveres, a pilcha e o lenço vermelho, símbolo da revolução, os guerrilheiros de Honório Lemes, todos civis, eram não mais de cem, e ainda assim marcharam em direção ao interior do Rio Grande do Sul, se iniciava uma nova campanha guerrilheira.

Os combatentes atacaram uma estação de trem, sabotando as linhas férreas e adquirindo cavalos e armamento, além de voluntários para a guerrilha, e partiram para a Serra do Caverá, onde esperavam se encontrar com outros exilados que atravessaram a fronteira. Porém, de todos os que planejavam a revolta, apenas Honório Lemes havia, com sucesso, penetrado no interior do estado, seus companheiros em Dom Pedrito e Santa Vitória do Palmar haviam sido, com muito esforço, forçados a recuar de volta para o Uruguai.

Coluna de Honório Lemes na sede da prefeitura de Alegrete, após tomar a cidade. Foto: Reprodução/Genealogia dos Lemes

Após um breve período de luta contra a Brigada Militar, onde muitos dos inimigos do povo foram justiçados pela degola, Honório Lemes se viu completamente cercado. Prezando pela vida dos rebeldes sob seu comando, o general negociou a liberdade dos homens, e se entregou. Passou dois anos preso em Porto Alegre, sendo solto em 1927. Na mais profunda pobreza, retornou a Rosário do Sul, trabalhou como carvoeiro até o fim de seus dias, lutando para libertar seus filhos, também combatentes da revolução de 1923, que ainda estavam presos no Brasil.

Faleceu, em 30 de setembro de 1930, deixando a vida para adentrar para a imortalidade. Honório Lemes, grandioso líder popular, que ousou abandonar tudo, arriscando a vida para pegar em armas contra os inimigos do povo, os tiranos que se banham em sangue das massas. Em sua lápide, está escrita a fala de sua autoria que ressoa até hoje no coração de quem nasce, vive e morre sob o jugo das tiranias latifundiárias e fascistas: Quero leis que governem homens, não homens que governem leis!

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