A dificuldade de Luiz Inácio e o fracasso do 1º de maio das centrais sindicais governistas

Seja por qual lado que se queira tomar, o governo Luiz Inácio está cercado de insatisfações que, embora não rebentem no imediato, são tão numerosas e tão volumosas que não será possível conciliar por tanto tempo estes interesses antagônicos. As décadas de ataques continuados contra os direitos do povo constituem material inflamável que deve ser levado em conta nos cálculos políticos de todos.

A dificuldade de Luiz Inácio e o fracasso do 1º de maio das centrais sindicais governistas

Seja por qual lado que se queira tomar, o governo Luiz Inácio está cercado de insatisfações que, embora não rebentem no imediato, são tão numerosas e tão volumosas que não será possível conciliar por tanto tempo estes interesses antagônicos. As décadas de ataques continuados contra os direitos do povo constituem material inflamável que deve ser levado em conta nos cálculos políticos de todos.
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O esvaziado do ato governista de primeiro de maio em São Paulo, mesmo com a presença de Luiz Inácio e praticamente todos os ministros do governo, é sinal de que a política sindical das principais centrais do País só pode colher a repulsa da massa de trabalhadores.

Ao longo dos últimos dois anos, as centrais sindicais se abstém de lançar um chamado claro para os trabalhadores brasileiros defenderem seus direitos pisoteados. Desde a eleição do quinto governo petista, as centrais se limitam a enfocar as mesas de negociações (em que o governo não atende às reivindicações). Defendendo que as greves no atual governo vão “fortalecer a direita”, é verdade também que as centrais não são capazes de frear o movimento grevista. Este, no ano passado, chegou à 1.132, um aumento de 6% em relação à 2022. De todo modo, a tática dos sindicatos amarelos, enquanto não for derrotada pela capacidade superior de organização dos trabalhadores (como a atual greve dos servidores da educação em curso, que mobiliza mais de 80% das instituições) é um perigo, pois aponta para o abandono da histórica arma de luta do povo, a greve.

O fracasso do ato também está nas costas do governo federal. Expondo-se a ir à casa do povo, a praça pública, expôs a colher uma rotunda mensagem de indiferença do povo. Mesmo com verba pública, sindical e contando com aparatos de comunicação robustos, não colheu mais do que duas mil pessoas segundo grupo de pesquisa da USP. Esse é um episódio que expressa as grandes dificuldades enfrentadas por Luiz Inácio.

A dificuldade de Luiz Inácio em impedir, a todo custo, a tendência de queda de apoio popular (já constatada em pesquisas de opinião recentes) também se expressou no seu próprio discurso. É ilustrativo ver o que disse sobre a economia, a política institucional e a questão agrária. Três temas que concentram, cada um à sua maneira, os limites e os cercos que o governo federal enfrenta.

Sobre a questão econômica, Luiz Inácio tratou das medidas recentes de seu governo, destacando aquelas que passam pela articulação com o Congresso Nacional. Defendeu que são favoráveis ao povo as medidas econômicas propostas pelo governo, como a Reforma Tributária, a desoneração fiscal e outras. Ficou sem menção, porém, a revogação da Reforma Trabalhista e a Lei de Terceirização de Michel Temer e a Reforma da Previdência de Jair Bolsonaro. Sem receber uma crítica de Luiz Inácio – que se elegeu prometendo revogá-las –, a série de contrarreformas foram impostas pelo imperialismo e assumidas como prioritárias pelos últimos governos. A elas se alinha o governo de Luiz Inácio. É por isso que, mesmo anunciando investimentos em alguns setores específicos (como o automobilístico, que deve receber R$ 150 bilhões), o trabalhador brasileiro não se empolga. A consequência é que os índices de aprovação não crescem para além daquilo que já existe.

No âmbito da política institucional, Luiz Inácio defendeu que não há crise política, saudou as relações entre governo e Legislativo e o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais), e vibrou ao afirmar que todos os projetos considerados prioritários estão sendo aprovados. Ele também elogiou a “competência dos ministros e dos deputados”. Não é difícil saber como essa defesa das carcomidas instituições políticas brasileiras reverbera no povo brasileiro – segundo pesquisa Datafolha de abril de 2024 apenas 22% da população vê o trabalho do Congresso como bom.

Peguem-se as emendas parlamentares, que chegaram só em 2024 a R$ 14 bilhões, e temos aí a origem da “capacidade de diálogo” de Padilha, da “competência” dos deputados e de tudo que Luiz Inácio tenta pintar como “harmonia entre o executivo e o legislativo”. Para o brasileiro médio, o bom funcionamento das instituições (coisa que somente Luiz Inácio pode afirmar que há nos dias de hoje) não é razão para apoiar nem um, nem outro. Chamada vulgarmente de “toma lá, dá cá”, a política de favores não pode contribuir para o aumento da popularidade de um governo eleito na base da crítica do poder que Arthur Lira tinha sob o governo de Jair Bolsonaro.

Por fim, a questão agrária é também sintomático de dificuldades para o governo Luiz Inácio. Ao apresentar Paulo Teixeira, ministro do Desenvolvimento Agrário, para o público presente no ato, o presidente falastrão destacou o programa “Terra para gente”, medida que prevê criar um “banco de terras”. Ele assim resumiu o programa: “ele pretende oferecer aos sem terra, Contag, Fetraf, para todos que querem a reforma agrária que não precisa mais invadir terra porque nós temos uma prateleira de terra para poderem escolher e ir trabalhar”. No ano passado, o governo apresentou o maior plano Safra da história, destinando R$ 364 bilhões para a produção do latifúndio, responsável pela exportação de grãos para o exterior. Para o programa que pretende criar 10 modalidades de prateleiras serão destinados parcos R$ 520 milhões, pretendendo beneficiar 73 mil famílias.

Se Luiz Inácio pretendia atender aos interesses da Contag, por exemplo, ele falhou redondamente. Em um levantamento, a entidade nacional de camponeses chegou à conclusão de que seriam necessários pelo menos R$ 7 bilhões para a realização da “reforma agrária”. Já o MST afirma que são necessários R$ 2,8 bilhões anuais. Ocorre que o Orçamento está nas mãos dos mesmos de sempre, especificamente do latifundiário Arthur Lira, hoje chefe do Centrão. Por conta da falência da Reforma Agrária, organizações como a Liga dos Camponeses Pobres (LCP) defendem a Revolução Agrária, reunindo milhares de famílias por todo o país, tomam terras do latifúndio e realizam o Corte Popular. A nenhum desses setores do campesinato brasileiro a medida de Luiz Inácio atende. E os conflitos no campo seguem crescendo: no ano passado o número de 2.203 representou o maior número desde 1985 (início da série histórica realizada pela CPT).

Seja como for, seja por qual lado que se queira tomar, o governo Luiz Inácio está cercado de insatisfações que, embora não rebentem no imediato, são tão numerosas e tão volumosas que não será possível conciliar por tanto tempo estes interesses antagônicos. As décadas de ataques continuados contra os direitos do povo constituem material inflamável que deve ser levado em conta nos cálculos políticos de todos.

Como a cobra que morde o próprio rabo, o ponto de partida do governo é o início do seu fim. Seu discurso de que “não se deve favorecer a direita exigindo demais” abre espaço para que cresça a insatisfação popular com um governo entregue para direita nos planos econômicos e também políticos.

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