Nos 60 anos do golpe militar, dossiê inédito de indígenas vitimados é publicado

Um levantamento inédito feito pelo Cimi mapeou a origem dos povos nativos aprisionados em Minas Gerais no Reformatório Krenak e Fazenda Guarani, campos de concentração e centros de tortura criados pela ditadura militar, regime fascista instaurado em 1º de abril de 1964.

Nos 60 anos do golpe militar, dossiê inédito de indígenas vitimados é publicado

Um levantamento inédito feito pelo Cimi mapeou a origem dos povos nativos aprisionados em Minas Gerais no Reformatório Krenak e Fazenda Guarani, campos de concentração e centros de tortura criados pela ditadura militar, regime fascista instaurado em 1º de abril de 1964.
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Um levantamento inédito feito pela Cartografia dos Ataques Contra Indígenas (Caci), órgão do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) conseguiu mapear, mesmo enfrentando dificuldades informativas, a origem dos povos nativos aprisionados em Minas Gerais no Reformatório Krenak e Fazenda Guarani, campos de concentração e centros de tortura criados pela ditadura militar, regime fascista instaurado em 1º de abril de 1964.

O dossiê denominado O campo de concentração de índios de Minas Gerais foi divulgado tempos atrás e mostrou que os índios vitimados pertenciam a 23 tribos diferentes, do país inteiro, localizadas em 11 estados de 5 regiões. Eram elas: Karajá, Terena , Maxacali, Pataxó, Kadiwéu, Xerente, Kaiowá, Bororo, Krahô, Guarani, Pankararu, Guajajara, Canela, Fulni-ô, Kaingang, Urubu, Campa, Xavante, Xacriabá, Tupiniquim, Sateré-Mawé, Ashaninka, Javaé (a acrescentar os próprios Krenak, talvez os mais afetados).

Mas tais dados podem estar aquém da realidade da repressão, pois recentemente soube-se, através do pesquisador Marcelo Zelic, que a estimativa é de que foram encontrados registros de somente 20% das detenções naqueles presídios.A seguir apresentamos trechos do dossiê, adaptados jornalisticamente.

“Denúncias gravíssimas”

“A sistematização de registros históricos, além pesquisas de novos documentos e depoimentos, possibilitou a organização pela primeira vez, de um mapa (acessível na internet) que indica a origem dos indígenas detidos no Reformatório Krenak e, depois de 1972, na Fazenda Guarani, ambos em MG. O Krenak funcionou como um campo de concentração e um centro de torturas, conforme um capítulo do relatório da Comissão Nacional da Verdade (CNV).”

“Entre os documentos reunidos,há denúncias gravíssimas envolvendo ambos os centros e também a Guarda Rural Indígena (GRIN), além de relatos que incluem o nome dos responsáveis por tais violações.”

Manoel Pinheiro, capitão da PM mineira foi um dos citados, junto com outros 6 policiais. O mais revoltante é que também índios foram obrigados a virar torturadores. Foram os recrutados para a GRIN,  que foi treinada em técnicas de tortura, conforme o filme “Arara”, de Jesco von Puttmaker.

General Bandeira: maldades e ouro

Outro nome associado aos torturadores foi o do general Oscar Geronymo Bandeira de Melo.Criador do Reformatório e presidente da FUNAI entre 1970 a 1974, é tido como responsável por manter o Krenak “como instalação prisional e local de tortura, morte e desaparecimento forçado de indígenas”.

O general chefiou também a Segurança e Informação da FUNAI, subordinada ao “famoso” Serviço Nacional de Informação (SNI). Depois, ficou à frente da Mineradora Itapiranga do Grupo Bradin, onde recebeu autorização para pesquisar ouro nas terras dos índios Urubu-Kaapor.

Os mortos e os rebeldes

Os militares tentaram esconder os dados, mas a universidade gaúcha Unisinos conseguiu descobrir que cerca de 8 mil indígenas foram mortos durante a ditadura, somente na construção de rodovias. Eles foram vitimas principalmente das “correrias”, expedições de matança para “limpar e preparar” o terreno para as obras, através de incêndios e bombardeios.

Já o Reformatório Agrícola Krenak, que ficava no município de Resplendor (MG), começou a operar em 1969, aprisionando indígenas tidos como rebeldes. Em 1972 foi fechado e os detidos  transferidos para a Fazenda Guarani, em Carmésia (MG).

Em ambos, os presos estavam sujeitos a práticas como castigos físicos, trabalhos forçados e torturas (pau-de-arara, afogamentos, chicotadas etc).

A proibição de falar seu próprio idioma também era uma regra, sendo cabível punição física.

Em caso de fugas eram oferecidas recompensas em dinheiro para as pessoas de cidades próximas.

Se fossem pegos eram castigados e em alguns casos mortos. Como exemplo cita-se Dedé, Pataxó Hã-Hã-Hãe, enviado ao presidio por agir em conflito de terra. Dedé não aceitou o seu confinamento, fugiu e na perseguição teria sido afogado por um guarda.

Para saber mais

Teses acadêmicas e livros retratam a violência cometida pela ditadura militar contra os povos originários. Ex: 1)José Gabriel Silveira Corrêa. A ordem a se preservar: a gestão dos índios e o Reformatório Agrícola Indígena Krenak. Dissertação de mestrado em Antropologia Social. R.de Janeiro,UFRJ, 2000.

2)Egon Dionísio Heck. Os índios e a caserna: politicas indigenistas dos governos militares, 1964-1985. Dissertação de mestrado em Ciência Política. Campinas/SP, Unicamp 1996.

3)Rubens Valente. (Livro) Os fuzis e as flechas: história de sangue e resistência na ditadura. SP, Companhia das Letras, 2017. 

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